quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Pilarete




Eis a imagem original:

Para fazer justiça ao dono da propriedade:
(Cerealpor, Alegrete, Portalegre)
Na zona de Portalegre, existem muitos portões de propriedades com pilaretes semelhentes a este.




Nos últimos anos, tem havido, no concelho de Portalegre, uma grande preocupação com a traça das construções, tendendo sempre para uma aproximação a um estilo tradicional da região. Talvez isso tenha conduzido a alguma monotonia, mas, por outro lado, evita a proliferação de desenhos estapafúrdios que, ainda não há muitos anos, eram a nota dominante em tudo quanto era aldeia, vila ou cidade.
(As "maisons" até ficam optimamente em França!)


Cores públicas, privadas cinzas


                
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Não tenho nada contra o cinzento. Uma foto a preto e branco, com o seu jogo de contrastes, sem a distracção da cor, até pode ser, pese embora a inexactidão cromática, uma boa maneira de representar a realidade (ou aspectos dela).
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Embora o possa parecer, não estou a falar de fotografia. Comecei por referir o cinzento, porque esse adjectivo provém de “cinza”, Lat.cinis.
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Do que já não gosto tanto é destas, em nenhum dos seus significados.
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De cinzas é também o dia de amanhã, segundo a tradição.
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A quarta-feira de cinzas é o símbolo da hipocrisia.
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Bem “lhes” gostaria ter-nos sempre de quaresma. Mas isso não é possível. Nascemos pagãos (temos até de remediar isso através do baptismo, lembram-se?). Gostamos, naturalmente, de folia. O colorido do Carnaval.
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Temos então esse (este) dia de folga. Dia de tirar a barriga de misérias, de abusar do pecado, já a pensar na penitência que aí vem.
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É aí que começa a hipocrisia. Quem instituiu este curto interregno no reino das sombras fê-lo, não a pensar em nós, mas em si próprio. Para legitimar, com o dia de hoje, a eterna orgia/folia em que, portas adentro, vivem os impositores de certa moral.
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Roubo continuado, durante a tarde


Tudo se passou junto às águas calmas do Rio Tejo.
Passando junto a uma mansão de ar sinistro…
… vi um casal entretido a tratar da vinha, alheio às peripécias que ocorriam à sua volta.
A mansão situa-se junto à antiga estação dos comboios.
Era a hora errada (relógio parado) mas o local era certo.
Na chaminé da sinistra mansão, um casal de cegonhas afadigava-se na contrução do ninho.
Ali perto, na chaminé da antiga fábrica de pimentão, outro casal competia na tarefa com o primeiro.
Ei-las aqui recolhendo os materiais…
…num ninho próximo, presentemente desocupado.
A recolha prossegue.
Uma das aplicadas trabalhadoras, dirigindo-se ao local de recolha.
E agora regressando à obra.
Ali perto, num pilar das ruínas da fábrica, mesmo ao lado da via férrea, uma rola toma nota do que se passa, e vai comentando em voz alta.
Entretanto, passa o comboio que, com um apito estridente, põe final à história.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

J.

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Esta é, num brevíssimo resumo, a história de uma grande mulher.
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A grandeza não se mede pela estatura, nem pela fama ou poder. A grandeza é dada, a cada pessoa, pela sua capacidade de tornar melhores aqueles que tiveram a oportunidade de a conhecer. É grande quem cria mais do que aquilo que destrói.
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Veio da planície, fugindo de uma paixão que acabou mal, na certeza de encontrar a segurança do cumprimento de uma promessa. O recomeçar em confiança, uma vida difícil sem dias de descanso. Veio no comboio, ao encontro de quem apenas lhe prometera isso, e não era pouco.
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Pouco tempo depois, casaram. A actividade económica do casal, constava de um táxi, bomba de combustível, café e pensão, venda de lotarias, agência de documentação. Havia empregados, nalguns casos com laços familiares.
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Não houve descendência. A esta mulher, os filhos que a Natureza lhe negou, vieram-lhe multiplicados no enorme número de afilhados que teve, muitos dos quais acolheu e literalmente criou.
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O homem, ainda bastante novo, morreu subitamente. A ela, ficou-lhe nas mãos um encargo imenso. A situação económica não era a melhor. Quem tudo vai distribuindo, sem nada guardar para si, pode um dia ficar numa situação delicada. Foi gerindo tudo como pôde, ainda durante bastantes anos, até finalmente se retirar de parte das actividades. Os tempos foram mudando, outros empresários foram surgindo, com novos planos e ideias.
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Entretanto, morreu-lhe também uma ajudante preciosa, a irmã, com cinco filhos pequenos. Foi ela quem acabou por criá-los.
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Ficou com uma pequena pensão, na casa para onde foi morar. Alugava quartos e fornecia refeições a trabalhadores, estudantes, professores em início de carreira. Manteve a agência de documentação. Era essa a situação quando a conheci. Eu fui um dos seus hóspedes. Em certos dias, era um corropio de gente a tratar de documentos, geralmente coisas relacionadas com as cartas de condução e respectiva renovação.
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Era uma cozinheira excepcional, ajudada por alguma afilhada que já há muito a acompanhava, fazendo a felicidade dos estômagos dos hóspedes. Praticava uns preços extremamente moderados, compatíveis com as possibilidades dos pagantes, mas não com o amealhar de dinheiro por parte dela.
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Tratava-se de uma pessoa com uma capacidade de negociação e persuasão extraordinárias, intervindo frequentemente, a pedido dos interessados, na resolução de problemas pessoais delicados. Tinha a capacidade de conseguir conhecer a vida das pessoas sem nunca parecer que se estava a intrometer, tal o grau de confiança que inspirava. Sabia aconselhar e emitir, quando achava que devia, opiniões nem sempre fáceis de aceitar se viessem de outra pessoa. Usava de uma franqueza desconcertante e não era possível contrariá-la, ainda que se quisesse, pois tudo quanto dizia tinha sido seriamente pensado.
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Já para o final da vida, abandonou todas as actividades, passando a viver de uma pequena reforma.
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Depois da sua morte, soube que tinha deixado uma lista com os nomes das pessoas que ela desejaria que fossem informadas do facto. O meu nome constava dessa lista, e posso dizer que considerei e considero isso uma honra enorme. Entretanto, os familiares não cumpriram essa sua vontade, alegando não querer incomodar os nomeados, tendo, no meu caso, pedido desculpa por essa omissão.
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Jaz no cemitério da localidade para onde veio viver, longe da sua cidade natal, cujo nome compartilhava.
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